quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Wilson Pinto, R. I. P.


Morreu na semana passada, aos 76 anos, um Mestre do desenho animado no Brasil, Wilson Pinto de Jesus. Foi o criador do Petrolino, personagem que protagonizava desenhos animados que corriam as escolas, projetados em super 8, a ensinar às crianças a grandeza e o poder da Petrobrás e o slogan "o petróleo é nosso".
Wilson tinha uma carreira feita a trabalhar em diversos estúdios de animação no Brasil, tendo participado como desenhista e animador de centenas de spots publicitários e aberturas de filmes. Eu o conheci por volta de 1980 na Movedoll, empresa cinematográfica em Botafogo, Rio de Janeiro. A Movedoll pertencia ao cineasta húngaro Francesco Lakihazy, que vinha da Cinecittá e que, nessa altura, possuía a melhor trucagem óptica do Rio de Janeiro. Para se ter uma ideia, era na Movedoll que se filmavam as animações das vinhetas da Globo, concebidas por Hans Donner. Nos porões da casa onde funcionava a Movedoll, havia um departamento de animação dirigido pelo animador e artista plástico argentino Arturo Uranga. Wilson Pinto era como que o seu imediato, o animador-chefe. Aprendi com Wilson a soltar o traço, enquanto observava o movimento rápido do seu desenho. Eu na altura pintava acetatos de desenho animado e ele me encorajou a intervalar. Não demorou muito a me passar cenas inteiras para intervalar, surpreendentemente confiando em mim, um garoto. Eu então tinha 17 anos, e intervalar (desenhar os movimentos dos bonecos nos frames, entre o início e o fim de um movimento) era assim uma grande honra. Nessa altura fazíamos o comercial da marca Sapasso para a agência Estrutural, aquelas botinhas humanizadas que falavam, quem via televisão nesta época na Região Sudeste do Brasil com certeza vai se lembrar.
A habilidade artística de Wilson Pinto não ficava por aí: ele tinha ouvido musical – o que ajudava na profissão. Cultivava o hábito de levar onde quer que fosse um pequeno rádio de pilha, sempre ligado, regra geral, na Rádio Globo. Na pausa do café, costumava improvisar o ritmo de rock'n roll com as mãos, na prancheta, enquanto sussurrava por cima uma canção qualquer da Jovem Guarda – tinha vibrato e ritmo. Era um pequeno show.
Wilson tinha também uma faceta de inventor, tendo patenteado várias ideias, sendo que uma delas quase entrou em produção: um ténis no qual o usuário podia trocar toda a parte de cima. O pano do ténis ligava-se à sola por meio de um fecho-eclair.  Esteve para ser produzido por uma fábrica de sapatos de Franca, São Paulo  – tive nas mãos um protótipo fabricado lá –, mas um desentendimento qualquer com o fabricante sobre a distribuição dos royalties inviabilizou o projecto, mesmo na fase inicial da produção.
Wilson conheceu ou foi colega da nata dos animadores e desenhistas de histórias em quadrinhos do Brasil, da sua geração, como por exemplo, Maurício de Souza. Contava-nos histórias e mais histórias, sempre com cunho humorístico, da vida profissional nos estúdios e a gente louca que os habitava. Era um documento vivo da animação no Brasil. 
Quando saí do Brasil, em 1989, o último trabalho que fazia com regularidade com Wilson era a  página de quadrinhos do personagem Petrolino, que era publicada na revista da Petrobrás. Wilson desenhava a lápis e eu passava nanquim e fazia as letras. Este trabalho depois passou para um amigo meu, Nei Lima, que o prosseguiu e que se tornou também amigo de Wilson Pinto.
Nos últimos anos, Wilson usava um marca-passo.
É mais um Mestre que se vai. Mas que será para sempre lembrado.